15 de abril de 2008

Estácio silencia o seu passado

Falta de apoio prejudica o resgate da memória da primeira escola de samba

Ismael Silva na Lapa: O fundador da Deixa Falar em um dos redutos mais tradicionais do samba

A memória da primeira escola de samba está comprometida por problemas semelhantes aos que resultaram no seu fim há quase 80 anos. Fundada em 12 de agosto de 1928, a Deixa Falar, do bairro do Estácio, acabou quatro anos depois, devido a desentendimentos entre membros da Diretoria, inclusive com acusação de desvio de verba. Nos dias atuais, o G.R.E.S. Estácio de Sá que herdou a história das agremiações do local, enfrenta problemas internos para manter a sua memória viva após o fim do Grupo Cultural Memória Berço do Samba em 2007.

“A Diretoria da escola fez diversas promessas e não cumpriu”, afirma um dos integrantes do extinto grupo. Segundo ele, a falta de apoio e a interferência de diretores na autonomia do grupo, acabou desmotivando os integrantes em seguir realizando as reuniões e se posicionando de forma clara frente aos desafios. “Só aceitaria participar de algo novo com os mesmos propósitos, com outra configuração de integrantes e se a Diretoria aceitasse nossas condições para realização de um projeto sério, oferecendo apoio, com espaço, equipamentos e material necessário”, complementa.

Grupo ajudou a escola a recuperar o prestígio no carnaval de 2007

Criado em junho de 2004, o Grupo Cultural Memória Berço do Samba foi um dos principais responsáveis por recuperar a auto-estima dos componentes da agremiação, que no carnaval daquele ano havia sido rebaixada para o Grupo de Acesso B. A partir daí, começou uma movimentação, liderada pelo então Mestre de Bateria, Esteves, para reestruturar a Estácio. Esteves recebeu o apoio dos presidentes do Conselhos Deliberativo e Fiscal, e semanalmente eram realizadas na quadra, reuniões abertas à participação de todos os simpatizantes e torcedores da escola. A proposta fundamental era a busca de parcerias e de reorganização administrativa.

Apesar da dificuldade financeira e do momento adverso da escola, alguns sambistas acreditavam que o resgate da riquíssima história da Estácio podia ser um trunfo para que a agremiação voltasse a ter dias de glória. Formou-se, então, um grupo que contava com onze pessoas com o objetivo de pesquisar, recuperar, catalogar e expor todo e qualquer documento e objetos relacionados à trajetória e história do G.R.E.S. Estácio de Sá e as agremiações anteriores do bairro. Além disso, o grupo buscava contribuir para a valorização de figuras importantíssimas no universo das escolas e do samba, muito esquecidas pela maioria até os dias de hoje.

O trabalho rendeu frutos. Foi produzido o documentário “O Rugido do Leão” que mostra o dia-a-dia da agremiação, sua comunidade, histórias, depoimentos de personalidades e imagens do desfile de 2005, quando a escola subiu para o Grupo de Acesso A. A escola resgatou a garra e os bons momentos do passado e reeditou o enredo “Arte Negra na Legendária Bahia” de 1976. Em 2006, novamente com uma reedição (Quem é você? - 1984) a escola fez um belo desfile, foi campeã e retornou ao Grupo Especial dez anos depois.

Professores de samba saíam do bairro do Estácio

A história do Estácio se confunde com a do samba carioca. O bairro fica próximo à Praça Onze, que no início do século 20 era reduto de negros, malandros, prostitutas e sambistas. Era naquela área que ficava a casa de Tia Ciata onde foi criado o primeiro samba “Pelo Telefone”, de Donga e Mauro de Almeida. No entanto, Ismael Silva e outros bambas do Estácio começaram a desenvolver um tipo de samba mais adequado para os desfiles carnavalescos, que permitia aos foliões que andassem e cantassem as músicas.

Isso gerava uma disputa entre os sambistas do Rio de Janeiro, pois cada um considerava o bloco do seu bairro o melhor. A turma do Estácio, respondia às provocações assim: “Deixa falar, deixa falar”. E como nas imediações da sede do bloco havia uma Escola Normal que formava professores para a rede escolar, Ismael dizia que era do Estácio que saíam os verdadeiros professores de samba. Por analogia, nascia assim, em 1928, a primeira escola de samba, a Deixa Falar. A agremiação desfilou como escola de samba apenas por três anos. Em 1932, a Deixa Falar se transformou em rancho carnavalesco e após um desfile fraco acabou se extinguindo.

A Deixa Falar influenciou os sambistas de outros bairros que buscavam maior aceitação por parte da sociedade e também escapar da repressão policial. Foi assim que na mesma época nasceram outras escolas de samba como a Mangueira e a Portela, as maiores campeãs do carnaval carioca. A Estácio de Sá somente surgiu em 1983, após a extinção e fusão de outras agremiações do bairro. Bairro este, que na Passarela do Samba conta a história e cultura do nosso povo e que não deve jamais perder sua memória.

Um comentário:

Unknown disse...

oi, david.
além de minha amiga, a gláucia é, quase sempre, desde muito tempo, a primeira leitora de muitos textos meus.
e de quando em vez ela se faz de ponte pra mais gente bacana.
bom te encontra por aqui.
voltarei mais vezes.
abs.